25 de jun. de 2011

Ela

Ela se nutria de dor. Sentada a seu lado, fazia-lhe carinho porque seu silêncio era perturbador. Estávamos no bar barulhento e nada era mais excessivo do que seu olhar. Tudo que pedia era uma chance de viver. Abriu mão por conta do marido, dos filhos e de algo não confessado. Estava como zumbi enquanto a vida pulsava. Queria estender-lhe a mão, conversar, dizer o quanto ela é capaz. Fiquei pensando o quanto as pessoas abrem mão por conta de coisas e,  depois de um tempo, percebe-se sem sentido, sem valor e sem reconhecimento. Ficou presa, acomodada, sustentada e sem pés, com o coração despedaçado, com uma ira muda. Pedi sopa, bebemos. Seus olhos continuavam marejados de lágrimas. Mas, foi o único instante  que ela se deu uma trégua. Acabou rápido, voltou à terra desconhecida por mim. Ela não quis compartilhar , não quis se ligar. Talvez a verdade fosse dura demais e talvez pudesse quebrá-la. Pessoa íntegra, amarrada a valores excessivamente cristãos, a uma moral estagnadora. Já não questiona, já aceitou abrir mão. Chego em minha casa com uma sensação pesada, de impotência.Quero acreditar que de alguma forma a toquei, que ela possa refletir e ir em direção a algo que a faça agir e ser mais feliz. Eu sempre quero acreditar na mudança, nos deslocamentos, nas sutilezas, nos encontros
Marisa Speranza