1 de set. de 2010

A Viagem de Clara

Clara chegou no domingo das férias de inverno. Foram vinte dias longe de casa. Esparramou-se na cama ainda com as malas sob os pés. Estava, aos poucos, se familiarizando com os cheiros . O travesseiro branco  lhe dizia que estava no lugar certo. Haveria de colocar os papéis em dia, as cartas, os e-mails e as contas a pagar. Tudo, em breve, voltaria ao normal. Por enquanto, sentia a saudade daquele louco amor que deixara  para  trás. Não teriam mais chances, seus universos eram completamente diferentes e suas vidas não estavam arranjadas de forma que pudessem  dar vazão aquela paixão que lhes arrebatou. Aos poucos, tomou coragem e meteu-se numa ducha fria e chorou. Há muito estava sozinha e foi por acaso que eles se encontraram, apesar dos livros e CDs sempre serem um chamariz. Começaram a conversa que evoluiu para um café. Depois disso, se perderam um nos braços do outro. Nunca esteve tão apaixonada. Pensava em largar tudo e ficar ali para sempre, enroscada no corpo do homem. Fizeram amor, riram, se alimentaram de beijos e salivas, saiam, jantavam, transavam, dormiam. Estava distante das coisas mornas que norteavam sua vida. Estava feliz! Trouxe na bagagem recordações desses dias. Fotos, flores secas e um pijama dele com seu perfume. No início, parecia que tudo seria possível, fizeram planos e sorriam diante de uma nova perspectiva. Os dias frios foram passando e, quando chegava a hora de ter que voltar, a tristeza tomou conta do espaço. Começaram a falar sério, com os pés no chão. Com o coração arrancado do peito, teve que abrir mão. Agora em seu quarto, sorri porque se acalmou. Pensou que todos os encontros começam assim e depois se esvaziam com  o tempo. Não conhecia aquele homem, apenas experimentou a idéia do que ela queria que ele fosse. Não poderia cair na armadilha do amor eterno, como se não houvesse  amanhã, como se as coisas não mudassem o tempo todo. Reagiu a seu delírio e agora tem certeza de que o que ela encontrou não estava nele. Apenas que ela foi capaz de se doar porque assim ela o desejava. Poderia encontrar outro amor no mundo e encaixar o seu desejo no dele, mais possível e menos embriagador.
Marisa Speranza

29 de ago. de 2010

Meu jeito/ Saudades do Elvis

Pessoas Quadradas


Existem pessoas que vivem dentro de seus quadrados. Não conseguem ir além dos contornos e aprisionam quem, por acaso ou por inocência, entrou para lhes dar alimento
Por que complicar tanto a vida, fazendo de conta que tudo tem lógica. A vida é tão intensa e cheia de aventuras. E, elas insistem em seus temores e crenças. Agarram-se aos seus botes e jamais se lançam ao mar de ondas espumantes. Não se lançam ao erotismo. insistem em manter as fisionomias fechadas e os corpos encapsulados.As costas eretas desfilam superficialmente sem se aprofundarem. Tornaram-se encouraçadas, sem emoção e sem pele. A inteligência  é um banco de dados. Não sabem o que é conversa fiada e não tocam as diferenças que taz com que o universo humano seja tão rico. São pessoas que não conseguem existir.Não sabem dançar.Quero chamá-las, gritar seus nomes, estender minhas mãos e  ajudá-las a terem mais coragem. Ultrapassar é preciso para termos mais felicidade. Não ousam perguntar porque querem controlar as respostas.Viver não requer explicações. Precisa- se de habilidade que só se adquire nos atalhos das rotas pré-estabelecidas. Machucar os pés descalços nas pedras e arranhar os joelhos na areia. Tudo faz parte de um todo que pulsa porque vive. Precisam sair na chuva e se molharem. Precisam relaxar. Entrega é como a flor que se abre para receber o que vem da natureza porque a ela pertence. Não compreendo o excesso de opiniões irrefutáveis.Elas me dão tédio. São tão previsíveis. Quero entrar nessas caixas, bagunçar suas gavetas, despentear seus cabelos. Gostaria de ver mais emoção nos rostos endurecidos, mas que não fossem apenas de raiva. Gostaria de ouvi-las dizer: me pega!!!

Marisa Speranza

23 de ago. de 2010

Fatti Cosi - Um presente dos deuses

http://www.youtube.com/watch?v=CSdE0Sm_wRU


“NÓS SOMOS ASSIM!”
Nós, na escola escrevíamos poesias.
Aos sábados esquiávamos junto a ela!
Mas, não íamos alem de um beijo, nunca se ia!
Nós com o coração sempre em guerra, em qualquer idade!
Nós somos como todos os primeiros amores,
Mentirosos até chegarmos a ser sinceros!
Nós somos assim!

Crescemos vendo os filmes americanos!
O tempo nunca nos fez mudar!
Seguimos a vida escrevendo canções para vocês que estão sempre enamorados!
Nós que, talvez, sejamos os últimos cowboys!
Um uísque duplo não nos embriaga!
Se a cabeça roda é por amor.
Nós somos assim!

Nós trocamos o dia pela noite!
Temos 9 vidas como os gatos!
Até paramos de fumar, mas não perdemos o vicio de sonhar!

Melancolia às vezes você se enamora de mim!
Mas, to fora!
Aperto firme o punho e digo não!
Vai embora temos ainda vontade de festejar!
Nós procuramos alegria!
Nós somos assim!

Nós jovens eternamente enamorados somos assim!
De jeans ou vestidos de gala!
Com dinheiro no bolso ou sem nenhum trocado,
Ciganos, filósofos e românticos,
No fundo somos todos parecidos!

Melancolia às vezes você se enamora de mim!
Mas, to fora!
Aperto firme o punho e digo não!
Vai embora amanhã te diremos sim!
Eis aí outra mentira!
Nós somos assim!


21 de ago. de 2010

Um Corpo

   Hoje foi incrível. Dia cheio e potente. Bons encontros em um só corpo. Agenciamentos gerando devires e acontecimentos. Tudo revigorante. Estava cansada e, aos poucos, meu peito foi se abrindo e meu olhar ficou mais atento. As pessoas eram cores, formavam  um lindo mosaico. Me faz tão bem ser deslocada de lugar, uma temporária desterritorialização. Linhas de fugas iam se intercalando e o sol brilhava. Dentro de mim, ao mesmo tempo, surgiam novas configurações, sem tempo para definição. Não era algo da ordem do explicado e sim dos afetos. Eram muitos "eus" e algum deles chegou e depois saiu novamente. Era algo além e alegre. Uma brincadeira quando se é criança; talvez só elas sejam capazes com tanta naturalidade, antes de serem formatadas e tornaram-se prisioneiras de identidades fixas, status quo e das fantasias que tomam o lugar da experimentação. Como viver é bom
   Marisa Speranza

20 de ago. de 2010

Vida

Quero saber de mais um dia. Quero estar em mais uma vida. Aqui mesmo, com mais ânsia. Viver é atravessar as distâncias entre mim e o outro. É respirar fundo e ultrapassar obstáculos. Viver também é ter prudência. Todos os meus cantinhos existentes não se cansam de quererem ir além, enfim, de querer mais vida.
Marisa Speranza

17 de ago. de 2010

Mudança na tensão

Mais um aniversário, mais um ciclo que se fecha para impulsionar outro. Minha festa foi contagiante. Meus amigos selecionados com o filtro da afeição e da alegria genuinas. Estou feliz, com vontade de reencontar pessoas antigas que andavam sumidas e que ainda me fazem bem. Vontade de construir novos caminhos, abrir espaços para o novo e não deixar coisas velhas, obsoletas me contaminarem. Ando cheia de pessoas super francas, aquelas que têm uma necessidade exorbitante de se exibirem. Franqueza me lembra convicção e, prefiro, atualmente, a gentileza. Quero exercer mais o encantamento, deixar prá lá o que não quer ser mudado; cada um deve conhecer os limites de seu corpo e de seus desejos. Excesso de qualquer coisa, me deixa zonza. Também não quero coisas equilibradas, se isso existe. Talvez queira ouvir, tocar coisas e pessoas que saibam dançar com a música da vida. Tenho exercitado a arte de evitar pessoas, essas que querem me deixar pesada, sem graça, constrangida. Não quero mais enfrentá-las, a não ser que elas queiram crescer na tensão da corda bamba que são feitos os encontros. Nesse ponto, surge algo bonito, inovador, que se celebra por si só porque pôde gerar mudanças.
Marisa Speranza

21 de jun. de 2010

O que me nutre

Andava sumida porque algo faltava. Ainda falta, tentando, de alguma forma, sair. Tudo na vida parece ser de repente e já sei que passado e futuro não existem. Só memórias que podem nos enganar. Meu cérebro está cheio de dados. A boa notícia é que ando exercendo mais minha presença, minhas relações com o outro e a natureza. Sou fruto de cultura, minha interioridade está cheia e eu cheia disso tudo.Como fico feliz em respirar, me sentir e estar. Já compreendi que estou em processo, não sou estagnada e já aceito a impermanência das coisas. Já abri o livro do perspectivismo e sinto que estou mais solta. Sem muita convicção, sem deus e sem pai. Que alívio não ter que lidar com coisas que não entendo, que querem fazer parte de mim a todo custo. Rejeito a força que tenta me moldar. Deixe eu sentir as coisas do meu jeito tão singular. Não quero mais ler jornais e nem livros que me esvaziam. Não quero mais estar com pessoas entediadas, rígidas e paralisantes. Quero compartilhar minhas partes com outras partes diferentes de mim, que somem e não diminuam. Gosto mesmo é de alegria a meu redor e, ela, pode até ser silenciosa.
Marisa Speranza