16 de jun. de 2007

Helena - um pequeno conto


Ela saiu de mansinho à procura de algum lenço para assoar o nariz. No meio do caminho, esqueceu porque estava ali, na sala. Olhou em volta, confusa e inesperadamente jogou-se no sofá. Estava entediada. Sua cabeça dava voltas não por causa do resfriado que até já esquecera, mas porque tinha a sensação de não saber para onde ia. Ficou paralisada por alguns segundos, mas o dever chamou-a. O feijão na panela e os gritos das crianças famintas, inesperadamente, lembrou a ela porque viera a esse mundo. Sua vontade era sair correndo, largar tudo e a todos e fingir que era alguém diferente. Seu olhar estava morto, sua voz já não falava, apenas gritava: Hora do almoço! Aquela gente pequena, seus filhos, é claro, como soldados, desceram e destruíram em pouco tempo tudo que ela fizera. Parecia o mito de Sísifo. Sentia-se assim: todos os dias as mesmas coisas. Que pessoa repetitiva, que mundo marcado por relógios e compromissos. Não sabia para onde ir. Limpou a mesa, lavou a louça, tirou as luvas e viu suas unhas mal tratadas pela vida. Sua imagem no banheiro, ao se olhar no espelho, mostrou-lhe que não sabia quem era. Procurou lembrar-se de seu nome. Procurou saber que sentido tinha um nome. Achou que era Helena. Parecia-lhe um nome bonito, em sua juventude, com seus cabelos loiros caídos pelos ombros. Agora esse nome lhe fugia e sentia-se na verdade uma Amélia, aquela que era uma mulher de verdade? Quanta ignorância, Helena pensou. Sentiu-se tonta e teve náuseas. Estava embrulhada. Ela era o embrulho. Coisas passadas, não estavam mais ali; sua memória já não ajudava. E seu futuro? Nem sabia seu nome, como saber pra onde ir. O presente vinha do quintal. Um cheiro de jasmim com suor de crianças. Já era quase noitinha. Mas o almoço não havia sido agora? Precisava fazer a janta. Levantou-se de sua letargia e foi pra cozinha. Descascou cebolas e chorou. Chorou muito porque sabia que Helena não mais existia.
Marisa Speranza

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